05.02.2023

Rio Branco, Brasil

 

  1. Quem é a Benedetta e como surgiu o despertar para a Vida Religiosa?

Sou natural de Ikalaasa, diocese de Machakos, Quénia. Nasci numa família que se dizia católica, mas nela não se falava de Deus, dela ninguém frequentava a Igreja. Em minha casa o Domingo era um dia como outro qualquer. Somos dez irmãos e eu sou a quarta deles.

Mesmo não sendo batizada, desde pequena, nasceu em mim um desejo grande e profundo de ser cristã.  Aprendi algumas orações, como o Pai Nosso, a Avé Maria, o terço na escola primária, onde havia um grupo de alunos que diariamente rezavam no início das aulas. Eu comecei a rezar com eles. Foi assim que comecei a conhecer Jesus e a falar com Jesus.

Não sei dizer concretamente como surgiu a descoberta da minha vocação religiosa, mas recordo-me que, desde a minha adolescência, já queria ser irmã. E nessa altura a única coisa que sabia era: “uma Irmã vive trabalhando na Igreja e para a igreja, não é casada e não tem filhos”.

Marcou-me muito a primeira vez que vi uma irmã consagrada. Tanto que nessa noite não dormi, a pensar “como poderei fazer para ser uma irmã, assim como ela?” então o desejo foi crescendo. Desde logo soube que era essa maneira de viver que eu queria para mim, mesmo sem ainda perceber todo o alcance do que é a consagração religiosa.

  1. Mas como seguir a Vida Religiosa sem o batismo?

Foi exatamente essa a provocação lançada pelos meus colegas quando eu, na sétima e oitava classe, comecei a dizer que o meu grande desejo era ser irmã religiosa. Os meus colegas riam-se e gozavam-me, dizendo “como é que vais ser uma irmã religiosa se não vais à Igreja, nem és batizada?” E eu entristecia-me por colocarem a ridículo um desejo que eu considerava tão sagrado e tão importante.

Tinha 15 anos quando o meu pai faleceu e dois anos mais tarde tomei a decisão firme de ser batizada e disse-o à minha mãe. Ela não aceitou e recusou-se deixar-me frequentar a catequese. Eu comecei a ir, mesmo sem a permissão dela, e outra das minhas irmãs seguiu o meu exemplo. A pouco e pouco fomos ganhando terreno e começámos a frequentar a Igreja ao Domingo. Tinha 18 anos quando recebi o sacramento do batismo.

Era tempo pascal, dia de luz e de graça. Enquanto eu estava na fila para receber o batismo lembro-me de rezar: “Ó Deus protege a minha fé, ajuda-me a não desistir da minha caminhada de cristã, mesmo no meio de tantas adversidades.” Foi um dia marcante na minha vida e procurei ser fiel aos compromissos do meu batismo. Ia todos os domingos à Eucaristia e todos os meses confessar-me.

  1. Como conheceste a Congregação das SFRJS?

Depois dos estudos o meu programa de vida era trabalhar 4 a 5 anos e depois entrar na Vida Religiosa. Trabalhei vários anos com o objetivo de ajudar minha mãe e os meus irmãos mais novos a pagar as propinas na escola, e as despesas básicas, porque na altura o meu pai já não vivia. Achei injusto entrar no convento imediatamente depois dos estudos, pensando que deveria fazer como o meu irmão mais velho também fez: ajudar em todas as necessidades. Além de ajudar os meus irmãos mais novos e a mãe, também procurava ajudar crianças e pessoas pobres. Não com grandes coisas, mas tudo fazia por amor.

Entre vários trabalhos a que me dediquei, o que mais me preencheu foi o de professora na escola primária. Depois dos cinco anos de trabalho, tentei seguir para a Vida Religiosa, mas a minha mãe não aceitou e, porque não queria desgostá-la, trabalhei mais uns seis anos. Mas Jesus continuava a ser Aquele ao qual queria dedicar-me por inteiro. Decidi então que não iria retardar mais o meu sonho de ser religiosa. Após alguma procura, e de até ter conhecido outras Congregações, alguém me deu o contacto do Padre Patrick Munishi, que era o promotor vocacional da Diocese de Mombasa. Nessa mesma noite liguei-lhe e ele deu-me o endereço das SFRJS. Fez-se luz na minha vida e uma nova esperança nasceu. Sei que o próprio Deus escolheu para mim esta Congregação… Deus é fiel.

Dia 29 de julho de 2010 cheguei a Portugal. Não foi fácil a adaptação à língua, à comida, à cultura e sobretudo ao clima!!! Mas com a graça de Deus, com a ajuda das Irmãs e muito esforço da minha parte tudo fui superando.

De 2011 a 2014 fiz a formação inicial em Moçambique e no dia 8 de dezembro de 2014 foi o grande dia da minha profissão Religiosa. Foi um dia de tanta alegria! E eu só pensava dentro de mim, numa enorme acção de graças: “Finalmente chegou o momento há tanto tempo esperado de ser irmã, com véu e hábito, consagrada a Jesus Cristo!” E sorria de felicidade.

  1. O que mais te atrai no carisma da Congregação das SFRJS?

O que me atrai no carisma das SFRJS é primeiramente a adoração ao Santíssimo Sacramento porque já tinha essa devoção muito tempo antes de ser admitida à Congregação. Já vivia muito a consciência da presença de Jesus no Santíssimo Sacramento, uma presença que me escuta e me conhece de perto. Gosto muito dos momentos de adoração e deste traço contemplativo do carisma da minha Congregação. Através da formação fui aprendendo também o que é reparação, muito característica da nossa espiritualidade, ou seja o oferecimento da minha vida, do meu amor a Jesus pelas faltas de amor e pelos pecados de quantos O ofendem.

Também aprecio muito no carisma da minha Congregação o específico da adoração “nos sacrários pobres e abandonados” que significa os locais onde a fé precisa do nosso testemunho e do nosso apoio. A adoração e reparação dos “Sacrários pobres e abandonados” é também o serviço junto das pessoas frágeis, pobres e simples, que são sacrários da presença de Jesus, e isto muito ao jeito de S. Francisco de Assis.

A profissão perpétua que vou fazer no dia 5 de fevereiro significa a plena realização do meu sonho de muitos anos, a entrega total da minha vida a Deus. E isto é fonte de muita alegria!

  1. Fala-nos dos motivos desta alegria e deixa-nos uma mensagem de felicidade neste Domingo das Bem-aventuranças.

O grande motivo da minha alegria é saber que Deus é fiel. A alegria de doar a minha vida ao serviço do Senhor e aos homens, com um coração indiviso, como uma missionária que sou pela graça de Deus. Sou feliz porque Jesus me olhou com misericórdia, chamou-me e confiou-me uma missão específica. Muita alegria porque fui capaz, com a graça de Deus, de responder ao seu chamamento. Sou feliz porque sou escolhida por Deus. Sou feliz porque, apesar de me saber fraca e pecadora, confio que Ele completará em mim a obra a que me destinou. Enquanto o mundo está atrás de poder, riqueza, dinheiro… eu quero servir o Senhor na pobreza e na simplicidade de coração. Sou abençoada Mutindi, porque faço parte da construção do Reino de Deus. Antes de ser Irmã, tinha uma vida bem organizada, tinha dinheiro e muita liberdade… mas não tinha paz dentro de mim. Agora sem nada, mas com Jesus Cristo que vai ser o meu único Esposo pela sua graça, tenho tudo.

Tenho o tempo suficiente com o meu Senhor; nos momentos de oração, reflexão, adoração, reparação. E quero como dizia a nossa Irmã S. João (a quem Jesus confiou o nosso carisma) fazer com que em cada coração que palpite sobre a terra, formar um trono a Jesus-Hóstia, em cada coração um altar a fim de que Jesus reine.

E é essa a mensagem de felicidade que gostaria de deixar a todos: quando Jesus reina no nosso coração somos felizes (bem-aventurados) e fonte de felicidade para os outros.

E uma mensagem aos jovens: estais à procura de ser felizes, à procura de uma plenitude, mas procurai primeiro a Deus e tudo o mais na vossa vida se encaminhará para a plenitude. Fazei o vosso discernimento. E se Ele vos chamar para o seu serviço: é uma bênção. Para o caminho que Ele vos chamar, não hesiteis dizer SIM!

Eu estou feliz pela minha escolha. Que seja um desafio para muitos jovens. E peço a todos que rezem por mim, por favor, para que seja fiel até ao fim.